19 de agosto de 2017

To Sail Beyond The Sunset



Robert A. Heinlein
To Sail Beyond The Sunset (1987)

To Sail Beyond The Sunset é o último livro do ciclo Future History, o terceiro da sub-divisão The World as Myth, publicado no ano anterior ao da morte de Heinlein. O livro é centrado na personagem de Maureen Johnson, mãe de Lazarus Long, que assume o papel de narradora, na primeira pessoa. Maureen, foi apresentada ao leitor na parte final de Time Enough for Love, quando Lazarus viaja no tempo até à sua infância; em The Number of The Beast, Lazarus, com a ajuda das quatro personagens principais e da sua nave senciente Gay Deceiver, concebem uma manobra que resulta na resgate de Maureen, retirada do seu tempo no momento em que historicamente morre por acidente, para ser transportada para Tertius no futuro distante onde Lazarus e o seu clã vivem. Em The Cat Who Walks Through Walls, Maureen era já uma das personagens secundárias integradas no círculo familiar de Lazarus. Daqui facilmente se poderá deduzir que To Sail Beyond The Sunset é novamente ambientado na temática dos universos paralelos, tornada preponderante a partir de The Number of The Beast; na realidade, contém numerosas referências a factos passados nos livros anteriores, mas quatro quintos deste tomo não não têm qualquer assomo de ficção científica.
No capítulo 1 encontramos Maureen, acompanhada de Pixel (o gato que atravessa as paredes), aparentemente apanhada num universo paralelo que não consegue identificar nem se recorda como lá chegou; o desenvolvimento dessa situação é retomado normalmente nos escassos primeiros parágrafos de cada um dos capítulos seguintes, acabando por se mencionar a sua integração no já conhecido Time Corps – uma organização que interfere em diversas linhas temporais tentando “consertar” a História, ou seja, fazer com que ela decorra “no bom sentido”. Será necessário esperar pelos três últimos capítulos para o desenlace desta trama. Entretanto, o grosso de To Sail Beyond The Sunset acompanha em retrospectiva a vida de Maureen Johnson, desde a sua adolescência, em finais do séc. XIX. A educação transmitida pelo pai, Ira Johnson, a revelação dos planos da Howard Foundation, ainda nos primórdios; depois a vida adulta e familiar, o casamento com Brian Smith (personagem que reúne várias características autobiográficas), o nascimento dos dezassete filhos. Como pano de fundo, o panorama histórico da época – as guerras, as mudanças tecnológicas, as convulsões sociais – o que dá a Heinlein a oportunidade para um pequeno e incisivo ajuste de contas com o séc. XX, do qual o excerto abaixo transcrito é um belíssimo exemplo.
O tempo narrativo decorre mais lentamente até aos anos da Grande Guerra – quando se revisita o encontro de Maureen e Lazarus (sob o nome Theodore Bronson) em 1917, já descrito em Time Enough For Love, agora sob a perspectiva de Maureen – e vai progressivamente acelerando à medida que passa pela Terça-feira Negra de 1929, pela II Guerra Mundial e pelas décadas seguintes, com uma paragem em 1952 para descrever com detalhe a relação conflituosa com dois filhos adolescentes; volta a abrandar depois, no capítulo 23, para efectuar a ligação ao argumento de The Man Who Sold the Moon. O capítulo seguinte resume os anos decorridos até 1982, e termina com a sua morte e renascimento em Tertius. E tudo isto com um grande enfoque na sua vida sexual ou dos seus familiares. Nesse aspecto, não fica pedra sobre pedra: os homens deste livro têm uma forte vontade de usar um grande par de chifres, há swingers com fartura e o incesto é coisa pouca – como, aliás, já se havia visto nos livros anteriores. A diferença, aqui, é que o tempo histórico e o fundo sociológico não servem de desculpa, ao contrário de outras circunstâncias verificadas ao longo da Future History (por exemplo em The Moon is a Harsh Mistress).
Isto leva-nos directamente à análise das ideias que Robert A. Heinlein veicula através das suas personagens. Recorde-se que Heinlein seguiu uma carreira militar, a qual se viu forçado a abandonar, por motivos de saúde, aos 27 anos; por isso não surpreende a sua tendência para valorizar a ordem e a hierarquia nem o facto de ser referir sempre em termos apologéticos à instituição militar e respectivos valores. Natural do estado do Missouri, no midwest, a cultura do chamado “Bible Belt” deve tê-lo vacinado de algum modo, pois tornou-se ateu. Apesar do desenfreamento das personagens e das constantes agulhadas à moral e crenças cristãs, isso não transborda da sua esfera privada e participam na vida religiosa da comunidade, cuidando de manter as aparências; afirma-se, algures no capítulo 7, que o Maio de 68 não trouxe o “comportamento de uma cultura verdadeiramente livre; foi apenas a oscilação do pêndulo”. Apesar das mulheres desinibidas que estão no centro deste livro – e noutros da mesma série –, a igualdade de direitos nunca se confunde com o feminismo, pois elas interiorizam e assumem simultaneamente a sua posição mais ou menos tradicional na sociedade. Para além de todas estas contradições há outra ideia, mais que subliminar, a atravessar a narrativa e que se poderia resumir na frase «In Money we trust»... Inicialmente um democrata, Heinlein acabou por se aproximar dos republicanos, embora se considerasse libertário. Acusado de quase tudo – libertino, fascista, fetichista, racista, etc. – este escritor é mais um produto da cultura estado-unidense (ou da falta dela), liberal, eminentemente materialista, e incongruente até ao fim.

Time line three, code Neil Armstrong, is the native world of my sister-wife Hazel Stone (Gwen Campbell) and of our husband Dr Jubal Harshaw. This is an unattractive world in which Venus is uninhabitable and Mars is a bleak, almost airless desert, and Earth itself seems to have gone crazy, led by the United States in a lemming-like suicide stampede.
I dislike studying time line three; it is so horrid. Yet it fascinates me. In this time line (as in mine) United States historians call the second half of the twentieth century the Crazy Years — and well they might! Hearken to the evidence:
a) The largest, longest, bloodiest war in United States history, fought by conscript troops without a declaration of war, without any clear purpose, without any intention of winning — a war that was ended simply by walking away and abandoning the people for whom it was putatively fought;
b) Another war that was never declared — this one was never concluded and still existed as an armed truce forty years after it started... while the United States engaged in renewed diplomatic and trade relations with the very government it had warred against without admitting it;
c) An assassinated president, an assassinated presidential candidate, a president seriously wounded in an assassination attempt by a known psychotic who nevertheless was allowed to move freely, an assassinated leading Negro national politician, endless other assassination attempts, unsuccessful, partly successful, and successful;
d) So many casual killings in public streets and public parks and public transports that most lawful citizens avoided going out after dark, especially the elderly;
e) Public school teachers and state university professors who taught that patriotism was an obsolete concept, that marriage was an obsolete concept, that sin was an obsolete concept, that politeness was an obsolete concept — that the United States itself was an obsolete concept;
f) School teachers who could not speak or write grammatically, could not spell, could not cipher;
g) The nation's leading farm state had as its biggest cash crop an outlawed plant that was the source of the major outlawed drug;
h) Cocaine and heroin called ‘recreational drugs’, felonious theft called ‘joyriding’, vandalism by gangs called ‘trashing’, burglary called ‘ripping off’, felonious assault by gangs called ‘mugging’ and all of these treated as ‘boys will be boys’, so scold them and put them on probation but don't ruin their lives by treating them as criminals;
i) Millions of women who found it more rewarding to have babies out of wedlock than it would be to get married or to go to work.
I don't understand time line three (code Neil Armstrong) so I had better quote Jubal Harshaw, who lived through it. ‘Mama Maureen,’ he said to me, ‘the America of my time line is a laboratory example of what can happen to democracies, what has eventually happened to all perfect democracies throughout all histories. A perfect democracy, a "warm body" democracy in which every adult may vote and all votes count equally, has no internal feedback for self-correction. It depends solely on the wisdom and self-restraint of citizens... which is opposed by the folly and-lack of self-restraint of other citizens. What is supposed to happen in a democracy is that each sovereign citizen will always vote in the public interest for the safety and welfare of all. But what does happen is that he votes for his own self-interest as he sees it... which for the majority translates as "Bread and Circuses".
‘"Bread and Circuses" is the cancer of democracy, the fatal disease for which there is no cure. Democracy often works beautifully at first. But once a state extends the franchise to every warm body, be he producer or parasite, the day marks the beginning of the end of that state. For when the plebs discover that they can vote themselves bread and circuses without limit and that the productive members of the body politic cannot stop them, they will do so, until the state bleeds to death, or in its weakened condition the state succumbs to an invader — the barbarians enter Rome.’

Li anteriormente:
The Cat Who Walks Through Walls (1985)
The Number of the Beast (1979)
Amor Sem Limites (1973)

Ningún comentario:

Publicar un comentario